Av. Jabaquara, 2876 – Sala 2

Meu caso com o álcool começou quando eu era

Meu caso com o álcool começou quando eu era ainda uma criança de 10 anos. Haviam algumas festas em casa com a participação de meus tios com seus respectivos cônjuges, meu pai, minha mãe, meus irmãos. Era um ambiente alegre, tinha jogatina…buraco, as vezes truco. Todos se reuniam em casa por ser meu pai uma pessoa muito hospitaleira e festeira e que adorava tê-los por perto. E nessas reuniões havia bebida alcoólica como cerveja, vinho, whisky, cuba libre, ponche. Então, quando estávamos na sala todos conversando e bebericando com porções de amendoim eu só ficava junto observando como todos ficavam alegres e contavam piadas, brincavam comigo e com meus irmãos então eu entendia que deveria ser muito bom beber para ficar daquele jeito e por fim, quando passavam para a cozinha para começar a jogatina, minha mãe sempre me pedia para recolher os copos e pratos da sala. Eu adorava esse momento porque podia experimentar a tão falada “bebida alcoólica” sugando até a última gota de cada copo, levando-os para a cozinha sem que ninguém suspeitasse de nada. Alí, naquele momento já sentia o barato de beber. Era bom, apesar de forte, mas me alegrava. O fato é que, não sei se tem a ver eu ter bebido na infância e guardado esse ” barato ” em minha memória possa ter contribuído para que meu alcoolismo se desenvolvesse apenas aos 43 anos. Antes disso eu só bebia socialmente. Na verdade, meu pai me oferecia vinho em casa desde os 18 anos. Eu bebia em festas, na faculdade. Se fiquei de porre, dá para contar nos dedos. Era sempre contida. Dois ou três shops, 3 ou 4 cálices de vinho e quando começava a sentir que estava perdendo o controle…eu simplesmente parava. Eu fui uma bebedora normal até os 43 anos, quando meu pai faleceu. Eramos muito amigos e tínhamos muitas afinidades. Foi um tremendo baque ficar de repente sem meu amigão, pai, conselheiro enfim…tendo que viver numa família disfuncional, e que se desequilibrou ainda mais com sua morte. E tendo que tomar as rédeas de tudo. Vinda de um casamento fracassado e com um filho de 8 anos. Morávamos eu, meu filho, minha mãe e meu irmão que também desenvolveu o alcoolismo com a morte de meu pai. Eu e meu irmão tínhamos brigas terríveis onde minha mãe sempre o defendia e sempre me culpava de tudo. Meu filho assistia a tudo e eu não podia fazer nada para mudar a situação. Tentei sair de casa várias vezes mas sempre acabava voltando para viver nesse inferno. Foi aí que encontrei alívio na bebida. Primeiro no vinho, depois quando o dinheiro era escasso no conhaque, licor e cerveja. Foram dez anos de progressão da doença tornando minha vida cada vez pior. Eu trabalha como professora de inglês e muitas vezes dava aula com meia garrafa de vinho ou um copo de conhaque na cabeça. Foram muitas as vezes em que prometi a mim mesma parar de beber pois, meu filho , já adolescente me implorava para parar. Mas eu não conseguia. O álcool era mais importante que meu filho. Mas então, minha melhor amiga me levou para o AA, onde estou até hoje e em Novembro completo 4 anos de sobriedade. A diferença desses quatro anos com os dez da minha ativa é tão evidente, tão nítida que todos a minha volta perceberam. A começar por meu filho, minha mãe, meu irmão, minha irmã, minha melhor amiga e o melhor de tudo…eu mesma. Estou muito bem aqui pois produzo, raciocino, escuto o que as pessoas tem a dizer, escuto meu filho e a mim mesma. Me percebo cada vez mais e sou muito grata a irmandade de AA que salvou minha vida e na qual eu aprendo a cada dia, a cada 24 horas a dar valor a vida, as pessoas e aos meus sentimentos.